Capela do Centro de Formação Católica (Lages - SC)
Domingo, 18 de junho de 2017
Ex
19, 2-6; Rm 5, 6-11; Mt 9, 36-10,8
Hoje, o Evangelho mostra Jesus que planta e fixa o seu
olhar no coração de cada pessoa e da multidão. “Vendo Jesus as multidões,
compadeceu-se delas, porque estavam cansadas e abatidas como ovelhas que não
têm pastor”.
Com o coração enternecido, Jesus sente dor pela dor do
mundo, pela dor que cada ser humano carrega sozinho ou em companhia de alguém,
de alguns, em comunidade...
E que oferece Ele “àquela gente?” Oferece a sua
misericórdia, institui e inaugura o ministério da compaixão. “Esse” ministério
pode ser e deve ser exercido por todos! E é para esse ministério que Jesus convoca
os Doze: “A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. Pedi, pois, ao
dono da messe que envie trabalhadores para a sua colheita” (Mt 9, 37-38).
O que é a “messe grande” de que fala Jesus? Jesus viu uma
multidão de pessoas que o segue, uma multidão cansada, abatida, sem pastor. A
“grande messe” é então uma messe de cansaço, uma colheita de lágrimas, uma
vindima de dor. É a essa messe que Jesus envia os Doze, confiando-lhes uma
missão extraordinária... Não a missão de interpretar de maneira nova a lei
antiga, nem de serem mestres ou pastores: Confia-lhes, o “ministério da
compaixão” e da mansidão, da consolação...
Jesus faz dos Apóstolos
“operários” de um trabalho que se chama: proclamar – curar – ressuscitar –
sarar, libertar e dar...
A obra daqueles e daquelas que são chamados para a missão
é, em primeiro lugar, a piedade, a compaixão, a ternura, a consolação, que
devem exercer com gestos concretos, porque Deus não se demonstra, “mostra-se”;
não, porém, com palavras, mas com a vida, com o testemunho...
Nesse sentido, os membros
da CRB - Região Sul, aqui reunidos, darão
o seu testemunho, deixando-se “iluminar pela Trindade, em comunhão com a
Igreja, sentindo-se convocados/as a viver “em saída” e a tecer relações de
misericórdia, com palavras, gestos e atitudes humanizadoras, priorizando os
empobrecidos e vulneráveis, as juventudes e a ecologia integral. Pelas trilhas
da mística e da profecia e da esperança criativa, visamos fidelidade ao projeto
de Deus” (Horizonte CRB Nacional 2016-2019).
Quando
ouvimos as palavras de Jesus: “Pedi ao Senhor da Messe que envie trabalhadores
para a sua colheita, entendemos como um convite a rezar pelas vocações...
Contudo, significa muito mais do que isso... Significa pedir a Deus que me
envie a mim como trabalhador/a da compaixão, da libertação, que me envie a mim,
com um coração de carne, para comer o pão das lágrimas com quem chora (cf. Sl
80, 6), para beber o cálice do sofrimento com quem luta para que o mal não leve
a melhor. Que me envie a mim, e me dê mãos capazes de amparar e de acariciar,
de enxugar lágrimas e de transmitir força e coragem.
Creio que ainda não existe nenhuma escola onde se possa aprender
a exercer o ministério da compaixão. Quando alguém é ordenado sacerdote ou
emite votos religiosos, são-lhes atribuídos deveres e funções importantes,
contudo, não recebem o dom da compaixão. O dom da compaixão só “se aprende”
estando ao lado do Senhor, “permanecendo com Ele”, ficando aos pés do Mestre,
olhando a multidão que se acotovela, tendo olhos para ver a messe da dor, as
espigas do cansaço, que amadurecem continuamente. Diz um ditado hebraico que “o
maior pregador é o coração”: o “coração da compaixão” frente ao ser humano e
frente a Deus. De fato, você só consegue falar do Evangelho de modo convincente,
se ele conseguir dominar o seu coração, se você for seduzido e conquistado por
ele.
Os Doze Apóstolos escolhidos por Jesus tornam-se gente
com entusiasmo e com uma missão: os campos do mundo onde se devem perder
seguindo a bússola do coração. O seu pastor é um coração de compaixão e de
misericórdia.
O coração compassivo faz ecoar o maravilhoso anúncio: “O
Reino de Deus está próximo”, que significa, Deus está próximo, Ele está com
Você, com amor. Ou, como disse a primeira leitura: “Eu vos levei sobre asas de
águia e vos trouxe a mim” (Ex 19, 4). É o próprio Deus que me conduz até Ele.
Por isso, “se eu tiver de andar por vale escuro, não temerei mal nenhum, pois
comigo estás” (Sl 23/22, 4), bom pastor que carrega as minhas inseguranças. Sendo
pobre de tudo, Jesus não quis ser pobre de companheiros: 72 discípulos, 12
apóstolos, um grupo fiel de mulheres, incontáveis outras pessoas dispostas a
partilhar a poeira da estrada e a compaixão do coração. E dá-lhes o poder de
curar, caminhando em direção a um tesouro terrível de lágrimas, que o mundo
contém, que dele transbordam.
Dá-nos o poder de nos
fazermos “próximo de cada pessoa”, e é isso que dá início à cura – se me faço
próximo.
Jesus coloca um poder em mãos frágeis como as nossas, que
tecem juntas histórias luminosas e penosas, exemplos de esperança e gestos de
afronta.
E agora, hoje, dirige-se a mim, à minha pequenez e
fragilidade: o chamado sou eu. O Senhor espera a minha resposta, se também eu
aceitar, para mim, o ministério da compaixão, da solidariedade, da caridade.
O enviado é pobre: um bastão para apoiar o seu cansaço,
sandálias para palmilhar os caminhos. Não tem bolsa nem dinheiro, mas um
coração compassivo e asas de águia.
Eu não
tenho nada, a não ser um suplemento de asas, um caminho que conduz ao céu e
outro que conduz às cruzes da terra.
Jesus caminhava, pregando a proximidade de Deus e curando
todas as doenças, toda a pobreza, todas as dores. É essa, também, a missão que
nos confia a nós: anunciar que Deus está próximo de quem quer que tenha o
coração ferido; existir para Deus e curar a vida. Não mediante milagres, mas
cuidando dela: porque há males incuráveis, há feridas insaráveis, mas não há
nenhuma, absolutamente nenhuma, que não possa ser mitigada, curada, aliviada,
partilhada, suavizada.
Como Cristo, cada um dos seus discípulos e discípulas se
torna encruzilhada de finito e de infinito, de pés cobertos de pó e de asas de
águia.
Homens e mulheres compassivos, que se deixam elevar para
Deus, que se deixam conduzir até aos outros, que sabem tomar a seu cargo
rebanhos e searas, dores e asas, que sabem assumir também a compaixão divina
para com cada um de seus filhos e filhas cansados e perdidos.
Escutando os nomes dos Doze apóstolos, teria eu a
disponibilidade e a coragem de dizer: “Eis-me aqui, Senhor, envia-me a mim”?!.
Muitas vezes ficamos cansados, desanimados, pensamos que
os terrenos da vida são áridos, sobretudo, devido aos “maus” tempos de hoje.
Olhamos sempre para o suor do lançar da semente enquanto se lavra e requisitamos
a presença de especialistas, mas esquecemos o entusiasmo do semeador e a força
miraculosa do grão.
A frase de Jesus surpreende-nos: a messe é abundante! Da
semente preocupa-se Ele. Há tanto a ceifar porque o terreno ainda é bom,
semelhante ao das origens, e Deus confia no ser humano, como o agricultor
espera pelo verão perfumado dos frutos. Cada coração é um pedaço de terra
semeado de germe divino, um mistério onde se cruza a novidade da semente e a
aridez da rocha, onde se entranham as cheias mãos e o coração do semeador com o
nosso sedento deserto.
Às vezes, parece que somos mais católicos que discípulos,
muito convencidos para escutar o Evangelho. Parece que a missão começa por
aqueles que estão perdidos sendo de casa. Além disso, não é fácil amar e
compreender a Igreja. Grandes são as fragilidades, os contra-testemunhos, as
incoerências, os erros na história. Quem de nós sonharia colocar juntas 12
pessoas totalmente diferentes para realizar um projeto grandioso? Pescadores
como Pedro junto com intelectuais como João; tradicionalistas como Tiago junto
com pecadores públicos como Mateus? Tão diferentes em tudo, mas unidos no amor
ao Mestre.
Você sonharia que o seu e
o meu nome fossem acrescentados ao elenco? Nada de dramas. É Ele, o Bom Pastor,
que carrega as nossas inseguranças...
Não
existe uma escola que ensine a tornar-se apóstolo, porque “não são as palavras
e teoria, mesmo que muito belas, que contam”, mas é a convicção, a paixão e a
admiração que elas anunciam.
São gestos de
misericórdia que curam: com amor se anuncia o Evangelho, se distancia o mal, se
constrói um mundo belo e humano, se faz estrada rumo ao céu...
O
enviado – cada uma e cada um de nós – é pobre, mas tem a paz que ilumina os
passos, a força que ampara o caminhar e palavras que cativam o coração.
Enfim, obrigado, Senhor, por me confiar missão tão
maravilhosa, ou seja: a de testemunhar a alegria de Vos conhecer e de vos
seguir. Hoje e sempre. Amém.
Dom Nelson Westrupp, scj
Administrador Apostólico de Lages
Cf. Sementes de Evangelho Ano A, Pe. José Fernandes Caldas Esteves; Ir.
Maria da Conceição Afonso Borges; Ir. Maria José Diegues de Oliveira,
Secretariado Nacional de Liturgia – Diocese de Bragança-Miranda, Portugal,
2.10.2013, p. 109-111; A Esperança que nasce da Palavra, Ano
A, Ermes Ronchi e Marina Marcolini, Paulinas Editora – Prior Velho,
Portugal, 2013, p. 133-136.